Os premiados pela 14ª Mostra Produção Independente – Resistências

Realizadores e público em geral estiveram presentes na noite de encerramento 14ª Mostra Produção Independente – Resistências, nessa quinta-feira (05), no Cine Jardins. Foi um momento para anunciar os vencedores da Mostra Competitiva, homenagear escritora e pesquisadora Bernadette Lyra e celebrar uma extensa programação de nove horas de exibições, debates e lançamentos que aconteceu ao longo de quatro dias. Na ocasião, também foram exibidos os filmes da Mostra Paralela e realizado o lançamento do DVD Coletânea com filmes da Mostra Competitiva.

Para a presidente da ABD Capixaba, Leandra Moreira, a Mostra Produção Independente é um importante meio de difusão que permite dar visibilidade a temáticas políticas, estéticas e culturais atuais: “anualmente, esse evento possibilita que o público tenha um contato mais intenso e direto com o audiovisual produzido no Espírito Santo. Temos esse encontro dos realizadores entre si e com os espectadores. Esse é nosso modo de Resistir. Ao exibir nossos filmes contribuímos para a formação de uma sociedade mais justa, democrática e inclusiva”.

Filmes Premiados
Este ano, foram selecionados 30 produções entre cerca de 90 obras inscritas para concorrerem na Mostra Competitiva. Foram videoclipes, documentários, ficções e filmes experimentais que apresentaram um panorama da atual produção audiovisual do Espírito Santo. O júri Mostra, composto pela diretora e editora Iza Rosenberg, pela produtora Tania Caju e pelo diretor e roteirista André Félix, concedeu seis prêmios e uma menção honrosa.

A produção que levou o Prêmio Especial do Júri foi o webdoc Corpo Flor, de Izah Candido e Wanderson Viana. O documentário funciona como um dispositivo para pretende dialogar com pessoas negras que se organizam cultural e politicamente na contramão de imposições de gênero, sexualidade e comportamento. Foram contemplados com o Prêmio Incentivo às ficções Braços Vazios, de Daiana Rocha, e Guri, de Adriano Monteiro

Outras três produções levaram o Prêmio Destaque: Da Curva Pra Cá, ficção de João Oliveira, a ficção Quis, de Dominique Lima e o documentário Refúgio, de Shay Peled e Gabriela Santos Alves. A menção honrosa da mostra foi para o videoclipe Morenna – Blá blá blá, de Júnior Batista.

Os vencedores receberam troféus, bolsas nos cursos de aperfeiçoamento oferecidos pela Instituto de Artes e Técnicas em Cinema (Iatec), serviço de Encode para DCP oferecido pela Link Digital, e kits de acessibilidade da All Dubbing Group.

“Esse foi meu primeiro projeto profissional, os outros foram todos na guerrilha. Esse foi o primeiro projeto que ganhei. Queria agradecer a toda a equipe e a Daiana principalmente, minha companheira, que tá desde o início acompanhado o projeto, esse sonho, que virou realidade e tá ganhando o mundo, ganhando o país. E dedico o prêmio a todas crianças e pretos do país, principalmente aquelas que a polícia está matando. E também a Leandra, guerreira, que lutou pra manter a mostra. Acho isso super importante” – Adriano Monteiro – diretor do curta-metragem Guri.

“O Quis, que foi um filme de resistência, pois a gente lutou bastante pra fazer. Então hoje eu queria valorizar o processo. A maneira como a gente construiu esse trabalho ao longo desses cinco anos até gravar, e agora começando a distribuir. Valorizar o processo e agradecer a equipe que, em sua maioria, foi formada por mulheres” – Dominque Lima, diretora do curta-metragem Quis

Homenagem a Bernadette Lyra

“Enquanto eu puder, ponho meu coração, minha voz, minha mente, ponho toda minha vontade a serviço do que a gente pode fazer para resistir culturalmente enquanto o país está desmoronando de alguma maneira. O que é muito triste pra nós, mas a gente resiste. E eu digo mais: a gente sobrevive. A gente tem força sim”, disse Bernadette que ainda complementou: “Eu transfiro essa homenagem para todas aquelas meninas que filmam no Espírito Santo. Que elas considerem que eu estou dividindo com elas esse momento”.

Com o cinema lotado, a homenageada da noite recebeu o carinho do público e assistiu ao vídeo que recupera sua trajetória, produzido exclusivamente para a ocasião pela jornalista e escritora Livia Corbellari e pelo diretor Heitor Righetti. Além de uma das escritoras de maior destaque no Brasil, Bernadette Lyra é uma importante estudiosa no campo do audiovisual, foi a primeira Secretária de Cultura do Espírito Santo e, em 2018, foi considerada Pesquisadora do Ano, pela SOCINE (Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual), da qual é membra fundadora.

Reconhecida como uma das grandes escritoras brasileiras, a autora já foi indicada para o Prêmio Jabuti de Literatura, em 1997, com o livro de contos Memórias das Ruínas de Creta. Foi também professora do Departamento de Cinema da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA/USP) e responsável pela criação e estruturação do projeto acadêmico e o corpo docente do PPGCom em Comunicação Audiovisual da Universidade Anhembi Morumbi (UAM). Atualmente é professora emérita da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes) e professora visitante no Programa de Pós-Graduação em Comunicação (PPGCom) em Comunicação e Territorialidades da mesma universidade.

Mostra Paralela
Antecedendo a homenagem, o público ainda pôde conferir os filmes da Mostra Paralela, uma seleção que reflete as novas formas de pensar e fazer cinema no Brasil. A ficção Fluxo é uma produção protagonizada pela comunidade surda se passa em Patrimônio da Penha, no Espírito Santo. O curta-metragem conta a história de Ivo, terminólogo surdo que trabalha com tradução de textos técnicos da área de Biologia. O curta é fruto do trabalho coletivo do Cineclube Vendo Vozes, iniciativa que, desde 2017, atua para possibilitar o acesso de pessoas com deficiência auditiva às produções cinematográficas em Libras e de estimular a reflexão e o debate nos espectadores sobre acessibilidade e democratização do acesso à cultura.

Já o documentário Torre das Donzelas recupera, quarenta anos depois, a história de um grupo de mulheres presas políticas – entre elas, a presidenta Dilma Rousseff – que ocupou uma cela no presídio Tiradentes. O longa-metragem conta a história de luta das presas políticas no Brasil a partir da vida de mulheres militantes de esquerda na ditadura militar. Filmado em um grande estúdio, onde a prisão cenográfica se reergueu, as personagens e um elenco de jovens atrizes se misturam, formando um mosaico de corpos, vozes, sombras, silhuetas e sons. O filme foi premiado no Festival de Brasília, no Festival do Rio e na Mostra de Cinema de São Paulo, além de prêmios internacionais em festivais na Argentina e no Uruguai.

Uma realização da ABD Capixaba, a 14ª Mostra Produção Independente – Resistências conta com a colaboração da Secretaria de Estado da Cultura do Espírito Santo. São também apoiadores a All Dubbing Group, o Cine Jardins, a Comunicação Impressa, o Iatec, a Link Digital, as secretarias de cultura da Prefeitura Municipal de Vitória e da Universidade Federal do Espírito Santo/Ufes, o Sebrae-ES e a TV Gazeta.

PREMIAÇÃO

Prêmio Especial do Júri

  • Corpo Flor Webdoc, de Izah Candido e Wanderson Viana
    Pela contundência do tema, pela força das histórias tornando-o relevante e emocionante para múltiplas audiências e apontando para um promissor cinema porvir.

Prêmio Incentivo

  • Braços Vazios, de Daiana Rocha
    Pela força poética com que trata de um tema tão delicado e por traduzir de forma a transbordar para o público a vivência de duas mulheres negras.
  • Guri, de Adriano Monteiro
    Pelo olhar cuidadoso e corajoso com que trata a infância e pela excelente articulação da questão racial numa dramaturgia clássica.

Prêmio Destaque

  • Refúgio, de Shay Peled e Gabriela Santos Alves
    Pelo exercício de alteridade, aproximação e pela extrema sensibilidade e apuro técnico ao tratar do tema dos refugiados no estado.
  • Da Curva pra Cá, de João Oliveira
    Pela excelente execução dos signos do cinema de gênero, pelo apuro técnico e pela precisão nas escolhas que apontam para um futuro promissor.
    Quis, de Dominique Lima
    Pela complexidade do tema e do olhar interessante e seguro com que abordou a história.

Menção Honrosa

  • Morenna – Blá blá blá, de Júnior Batista
    Pela excelente articulação entre música, dança e moda, traduziu de forma muito singular o espírito do nosso tempo.

Fotos: Luara Monteiro